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O Ministério Público e a Unidade de Inteligência Financeira (COAF)

A importância das unidades de inteligência financeira nasce com a percepção, desde a Convenção de Viena de 1988 e das 40 Recomendações do Financial Action Task Force (FATF ou GAFI) de 1990, da necessidade de os países trocarem informações e experiências no tocante à prevenção às práticas de lavagem de dinheiro (art. 9, do Decreto 154/91).


Em razão de compromisso internacional assumido na referida Convenção Internacional, o Brasil instituiu o Conselho de Controle de Atividades Financeiras – COAF (Lei 9.613/98), o qual tem atribuição de fiscalizar, orientar e sancionar setores da economia nacional, nos quais se consideram possíveis atos de ocultação e dissimulação da origem de bens, provenientes da perpetração de crimes. Tal Conselho ostenta atribuição subsidiária àquelas de responsabilidade do Banco Central do Brasil (Bacen), Superintendência de Seguros Privados (Susep) e Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

A bem da verdade, correto seria se definir o COAF como unidade de inteligência econômico-financeira, pois tal conselho não cuida, de forma primordial, do sistema financeiro, mas trata de ilícitos concernentes à lavagem de dinheiro em diversos outros mercados.

Existem quatro modelos de unidade de inteligência econômico-financeira: (i) modelo judicial: atende prestação de informações de interesse da Justiça; (ii) modelo do “law enforcement”: implementa medidas anti-lavagem com outras autoridades administrativas ou judiciais; (iii) modelo administrativo: independente, atua na busca e fornecimento de informações; e (iv) modelo híbrido: intermedia informações e atua com órgãos judicias, bem assim com reguladores.


Nosso COAF gere volume relevante de informações, atuando no recebimento e destinação de dados quanto a “operações suspeitas” e regula diversos setores econômicos com deveres de registro, arquivo e controle sobre negócios jurídicos e clientes.


Trata-se de unidade de inteligência econômico-financeira na espécie administrativa, a qual não foi estruturada para atender a persecução penal, como pensam alguns de modo equivocado.


Fatos recentes demonstram que, em detrimento da proteção constitucional e legal do sigilo bancário (art. 5º., X e XII, e art. 60, parágrafo 4º, da CR c.c. Lei Complementar 105/01), bem como do controle de jurisdição quanto à matéria, o Ministério Público passou a requisitar informações e serviços de investigação de dados ao COAF, como se o conselho servisse a esse objetivo ilegítimo.


Em verdade, outra vez renasce a antiga moléstia, ou obsessão dos perseguidores públicos: querem esconder atividades investigativas, realizadas em procedimentos de gabinete, tanto do investigado como dos defensores, bem assim dos juízes naturais. Inacreditável tal doença ainda atormentar as cabeças de quem denominamos promotores de Justiça.


Essa deturpação de meios e fins acarretou, de um lado, a edição pelo Executivo da Medida Provisória 893 e, de outro, a determinação de suspensão, pelo ministro Dias Toffoli do Supremo Tribunal Federal, do processamento de todos os inquéritos policiais e procedimentos de investigação criminal (pic’s), instaurados sem análise judicial quanto a dados compartilhados pelo Bacen, Receita Federal e COAF (RE 1055941/SP, 15.7.2019).


Portanto, a razão pela qual o tema chega ao Supremo Tribunal Federal e se está a discutir no Congresso Nacional a modificação do COAF não surge política, muito menos econômica. Emerge, sim, do manifesto desrespeito à legalidade, assim como a princípios e regras da Administração Pública (art. 37, da CR) por quem deveria proteger a ordem jurídica, o Ministério Público (art. 127, da CR).


Não fossem os comportamentos viciados de tais funcionários públicos, o debate não teria se instaurado no país.


Por ora, a Alta Corte há de examinar a nulidade de procedimentos administrativos e judiciais, recheados de provas ilícitas, mais à frente os demais órgãos do Poder Judiciário terão de incluir a questão da responsabilidade de agentes públicos no âmbito de tantas ilegalidades por eles perpetradas.


Afinal, para que servem as leis? (Quid proficiunt legis?).


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