Na fase de estudante, a opção pela concentração em Direito Penal era indicativa do desejo de fazer concurso para magistratura, Ministério Público, ou polícia judiciária. Poucos ali estavam para seguir a advocacia criminal, diante da perspectiva de então que a enxergava entre romantismo e preconceito.
Havia um ranço na visão quanto aos criminalistas, graças a conhecimento e técnica jurídica terem se mostrado relativos para o sucesso de alguns velhos de profissão. Ao mesmo tempo, figuras extraordinárias, como a de Waldir Troncoso Peres, mitificavam a arte com suas milhares de histórias no Tribunal do Júri.
No Largo de São Francisco, em verdade, futuros advogados agrupavam-se nas classes de direito privado e mesmo os interessados no Direito Penal titubeavam na escolha da matéria, devido à desordem do departamento e à desídia de professores sem tempo para o magistério.
Em meio a tantas incertezas, cada qual buscava seu modelo de profissional, misturando qualidades de uns e outros. Nessa época, já escrevia a coluna Ponto Final, Paulo Sérgio Leite Fernandes. Advogado criminal, oriundo de Santos/SP, atuava na defesa das prerrogativas na OAB/SP, onde também era responsável pelo Jornal do Advogado – periódico da mencionada coluna.
Impossível não se impressionar com os escritos de Paulo Sérgio, dada a concisão e beleza de estilo. Suas palavras se combinam como na música, de forma leve, sem retirar a objetividade da descrição dos fatos, nem a força do argumento.
Mais do que isso, a qualidade de Paulo Sérgio está na coragem de se posicionar sobre pessoas e acontecimentos. Os artigos e petições vêm com a carga retórica na medida necessária para convencer o leitor do ponto de vista. Inexiste tergiversação. Há a convicção de quem escreve, com poder de fazer a cabeça do receptor da ideia.
No papel, o cuidado com a formatação do escrito, bem como a elegância dos poucos adjetivos usam-se como tática para reforçar a tese. O encadeamento das palavras leva a um processo de conscientização quanto ao drama da vida, o caso criminal, sem tornar o texto um apelo à emoção. Ao contrário, a absolvição emerge como produto da razão, nascente da apreciação do fato, com elementos e circunstâncias narrados sob o prisma de quem deseja entender o humano.
A defesa vai se estruturando na mente do leitor, com o fim de permitir até mesmo a compreensão de que era inexigível agir de outro modo. A etiqueta do crime torna-se, assim, um nada diante de um conjunto de dados fáticos que justificam a conduta, lhe retiram a culpa ou mesmo lhe conferem licitude.
A doutrina colacionada vem confirmar a versão defensiva sem cansar, sem ar de erudição, soando natural. O julgado se encaixa à situação em concreto, como manifestação da sapiência do tribunal que já enfrentou questão similar antes, ausente o medo de relevar a imputação.
Ao final, a síntese traz a conjectura quanto ao risco do erro judiciário, como instrumento de rememorar a responsabilidade do julgador e a impossibilidade de condenar diante da dúvida. Em suma, a defesa penal escrita combina redação e estratégia para o convencimento do magistrado.
Paulo Sérgio fez sua marca na advocacia criminal. Defensor preciso, centenas já puderam lhe ouvir nos tribunais a redargüir a acusação, vestindo a toga que pertencia a Ricardo Antunes Andreucci.
Escritor de artigos e livros, Paulo Sérgio foi inovador na comunicação ao criar um site na internet onde compila ideias, memórias, bem como critica à decadência de nosso tempo.
Ali, mais livre, subsiste a figura pública cujos verbos convidam a se sair da inércia deste momento histórico. Não teme dar a opinião, menos ainda se cala frente a proliferação de leis, ou a teratologia de recentes julgados. Rompe com as etiquetas ideológicas, para mostrar as incongruências do país, assim como as vicissitudes da profissão que abraçou. Expõe seus pensamentos em rápidos vídeos, nos quais sintetiza seu entendimento.
Escrever sobre Paulo Sérgio constitui-se num meio de trazer ao conhecimento de maior público a obrigação de algumas gerações de advogados que lhe devem gratidão. Trata-se do dever de agradecer ao decano pela transmissão do ofício e respectivos segredos que soube ensinar.
Paulo Sérgio merece essa distinção, por tudo quanto fez e é. Muito se teria a dizer sobre ele, como músico, romancista, escultor, gravurista, artesão, colecionador de arte, apreciador de carros antigos. No entanto, basta falar do advogado.
A Ordem dos Advogados do Brasil peca por não lhe fazer uma homenagem à altura. "E, ponto final." – apropriando-me de seu conhecido fecho.
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